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Crítica - Um Olhar do Paraíso

Peter Jackson é sem dúvidas um dos melhores diretores da atualidade, mas é também, o cineasta com carreira mais estranha, mais atípica. Começou com o terror extremamente trash, com muito humor e pitadas de pastelão. Trash - Náusea Total, Meet the Feebles, Fome Animal são os três primeiros filmes do cineasta e que pouco lembram o que o cineasta é hoje. Tirando a criatividade e a genialidade para criar mundos fantasiosos e seres estranhos, Jackson mudou bastante desde aqueles anos de trash. Jackson é daqueles diretores que aprenderam a dirigir e fazer bom cinema simplesmente dirigindo. Foi fazendo e errando que ele aprendeu. Assim como Quentin Tarantino, a grande escola do diretor foi o próprio cinema. Talvez fora através daqueles nauseantes trashs que Jackson aprendeu e concedeu a melhor trilogia da história. Como pode ser visto, Jackson sempre gostou de ousar. Com pouquíssimo dinheiro e situações precárias, o cineasta sempre lutou para filmar e lançar seus filmes. Fazia a maquiagem de cada alienígena ou monstro, escrevia, produzia, dirigia e atuava. Sempre gostou de fazer o impossível. De passar dos limites e fazer mais do que realmente podia e tinha condições. Foi assim no início, foi assim com a trilogia do anel, foi assim com King Kong e é assim com o ótimo Um Olhar do Paraíso.

Um Olhar do Paraíso
está mais para Almas Gêmeas (quarto filme de Jackson e primeiro mais sério. Recebeu a primeira indicação ao Oscar e lançou Kate Winslet) do que para O Senhor dos Anéis. Então, vá tirando seu pangaré da chuva e não espere muita grandiosidade. Talvez seja isso que faz com que as pessoas critiquem (injustamente) tanto o filme de Jackson. As pessoas vão a cinema com uma imagem errônea do diretor. Esperando demais. Isso não pode ocorrer com diretor ou ator algum. Temos de ir ao cinema com a mente aberta, atenta e vazia. Temos que esquecer todos os trabalhos anteriores e nos atentar apenas para o hoje, para o agora. Esqueça Frodo, Gollum e o gorilão. Aqui a história e o clima são outros e não há porque comparar o "branco" com o "preto". É claro que para Jackson foi extremamente difícil dar o próximo passo. Depois de angariar 17 Oscar e 3 bilhões de dólares com a trilogia do anel e surpreender o mundo com King Kong veio a dúvida: "como continuar?" "e agora?". Jackson, como sempre, arriscou. E muito. Invés de dirigir outra aventura cara, cheia de efeitos especiais e ação, Jackson optou por adaptar um drama. Drama mesmo. Daqueles sem ação, com bastante diálogo e uma mensagem diferente das que ele já passara até aqui. Muito torceram o nariz, claro. Mas outros, como eu, acharam a escolha certíssima. Já estava na hora de Jackson voltar para o terreno mais calmo e mais dramático. Eu (e creio que muita gente) queria ver se Jackson ainda sabia levar um drama sem muitos efeitos computadorizados com maestria. Queria ver se ele não tinha se deslumbrado com mundos gigantescos. E minha concepção foi melhor do que eu esperava: não! Ele não se deslumbrara e ainda sabe levar, magistralmente, um bom drama. Simples (até ali) e com forte carga emocional (até King Kong tinha forte carga dramática. Jackson sabe o que faz).

É claro, que para quem esperava outro longa do estilo Lord of the Rings, sem decepcionou. Mas desde sua primeira notícia The Lovely Bones já se mostrara um longa mais contido. Menos arriscado e mais pé no chão do que os outros longas. Apesar de beber na fonte da fantasia/ficção (até agora, TODOS os filmes de Jackson tem elementos fantasiosos. É só pesquisar e ver com os próprios olhos), Jackson se atém principalmente ao mundo real (como todos os seus filmes). A história: Susie Salmon é uma bela e inteligente garota de quatorze anos. Com os sentimentos mais profundos aflorando aos poucos, Susie está despertando para um mundo novo. Mas esta descoberta de um novo mundo é interrompida quando Susie, ao voltar da escola, é estuprada e assassinada pelo vizinho (Stanley Tucci, mais que sensacional). Susie então vai para um lugar entre este mundo e o paraíso. De lá, o "anjo assassinado" vê a reação de sua família com o acontecido e a impunidade de seu algoz. Entre o céu e a terra, Susie sonha com o que não irá acontecer e vê como as coisas caminham na terra. Tentando conexões com seu pai, Susie faz de tudo para denunciar seu assassino e passa por experiências inimagináveis.

Estabelecendo sempre uma conexão entre a terra e o "paraíso de Susie" (os barquinhos dentro das garrafas é uma das conexões mais fortes), Jackson sabe misturar bem os momentos no céu com os na terra. Visitando um lugar e outro regularmente, Jackson nos emociona (vejo muito de Spielberg em Jackson: mestre na técnica e manipulador raro de emoções) e abre espaço para alívios cômicos (muitos deles com Susan Sarandon). Jackson vai até o limite nos emociona e nos choca sem mostrar nada (novamente: vejo muito de Spielberg em Jackson): não vemos estupro e agressão alguma, mas todo o prólogo para tais crueldades nos parte o coração. Jackson, conhecido como um dos poucos diretores que sabem unir técnica, inteligência e alma em seus filmes, faz bonito aqui. Cuidando de seus personagens, Jackson injeta alma em cada personagem. Seja ele grande ou pequeno, cada um tem seu jeito de sofrer, cada um tem seu jeito de agir. São únicos. O pai (interpretado com simplicidade e emoção por Mark Wahlberg) tem uma sede obsessiva de justiça. A mãe (Rachel Weiz) não sabe como viver ante a tal tragédia, perdida ela foge de tudo e todos. A irmã, assim como o pai quer descobrir o monstro assassino e mostra uma força inacreditável. A avó (Sarandon), sempre de bem com a vida tenta trazer de volta uma alegria que parece nunca mais voltar e por fim: o assassino (Tucci). Humano, claro. Muitos criticam Jackson por fazer do assassino uma caricatura. Eu discordo completamente. Apesar de não sabermos objetivamente o passado do assassino, temos uma ideia. Acima de tudo, o matador é humano. Cruel e louco, mas humano. É aí que Jackson acerta. Jackson dá um início, um meio e um fim para cada um. No caminho sentimos o que os personagens sentem e nos identificamos ,ao menos, com algum. Mas Jackson, é claro, dá um espaço para técnica e para mostrar toda sua experiência na composição de planos e enquadramentos. Só pela técnica, Jackson já merece indicações a prêmios e aplausos. Quadros que parecem pinturas (a cena em que o assassino abre a tampa do esconderijo e de lá sai uma forte luz iluminando os dois é belíssima) e planos incríveis (o travelling vertical que passa pelo chão e mostra o esconderijo é um belo exemplo dentre vários) fazem parte de cada segundo do filme. Jackson capricha na plasticidade do paraíso. Com imagens belas e inesquecíveis, o paraíso do cineasta é colorido. É impossível comentá-lo aqui. A única coisa que posso fazer é dizer pra você assistir o filme e se deslumbrar com tais imagens. Merecia ao menos uma indicação de melhor direção a algum prêmio, tamanha a perfeição técnica. É claro que temos efeitos aqui (Peter Jackson ama um efeito especial). Quando chegamos ao paraíso, Jackson aproveita e incere uma porção de belos efeitos especiais. Tudo no paraíso é na base da computação gráfica. De enormes garrafas flutuando a folhas de árvores que se transformam em pássaros, tudo é visualmente perfeito.

O roteiro assinado pelo trio Jackson, Fran Walsh e Philippa Boyens se baseia no livro Uma Vida Interrompida - Memórias de um Anjo Assassinado, de Alice Sebold. Modificando alguma coisa aqui e ali e dando seus próprios estilos, os roteiristas fazem um trabalho, mas tropeçam de vez em quando. Cito apenas dois problemas que me chamaram bastante atenção: excesso de informação. O excesso de acontecimentos e tramas paralelas atrapalha. Jackson talvez não quis fazer novamente um filme com três horas de duração. Colocou os mesmo assuntos que colocaria num filme de cento e oitenta minutos só que com duas horas de duração. Resultado: amontoado de detalhes e tramas. É tanta coisa dita e tantos acontecimentos, que nem tudo é resolvido e alguma coisinha fica pairando. Jackson parece não dar conta de tudo e as duas horas parecem extremamente curtas para tudo que os roteiristas querem contar. Outro erro é o final. É claro que não revelarei nada, mas algumas coisas poderiam ser mais bem resolvidas (o destino de um personagem, especificamente). Algumas coisinhas acabaram e ficamos pensando: "só?", "nada mais, é só isso". Poderiam ter caprichado um pouco mais no final apenas.

Jackson pinta belos quadros, mas tem uma bela ajuda. A direção de arte do filme é, de longe, uma das melhores do ano. Caprichando no design do paraíso e na recriação da época, a direção de arte de Um Olhar do Paraíso foi injustamente esquecida nas premiações. Apelando para cores fortes a direção de arte é mais que fundamental para o filme. A fotografia é perfeita. Todas (ênfase no TODAS) as cenas no paraíso têm uma bela fotografia. Cada cena, cada segundo é amparado por uma belíssima fotografia (destaque para a iluminação). Com um figurino contido, e por consequência realista, toda a parte técnica do filme merece aplausos. O filme conta ainda com uma bela trilha sonora e efeitos especiais excelentes (afinal, é a WETA a responsável).

Mas não basta só técnica. Tem que ter um bom elenco. E este filme tem isso também. A começar pela bela e talentosa Saoirse Ronan. É incrível como uma garota de quinze anos tem um talento equivalente a muitas veteranas por aí. Ela tem um controle inimaginável sobre seu personagem. Mark Wahlberg surpreende pela competência e pela forte personalidade de seu personagem. Susan Sarando, competente como sempre, arranca os poucos risos. Mas é Stanley Tucci a estrela mais brilhante do elenco. Tucci concebe, sem dúvida, uma das melhores atuações masculinas dos últimos meses (perdendo apenas para Christoph Waltz). Seu personagem não é um mero assassino. Tem uma vida, uma fachada. Um papo convidativo e uma face real extremamente real. Bom de papo e podre em seu âmago, o personagem dá nojo mas nunca se torna desinteressante (não entenda errado, eu não simpatizo com estupradores, eu abomino, assim como todo mundo quero não apenas presos, mas a sete palmos da superfície terrestre), afinal, a cada vez que a câmera desvia de sua vida e de sua história queremos que ela volte imediatamente e mostre mais um pouco daquele monstro tão bem interpretado por Tucci.

Emocionante, Um Olhar do Paraíso me conquistou. Diferente de quase todo mundo, adorei o filme. No final queremos mais. Queremos mais emoção e mais daquelas cenas belíssimas. Não está isento de erros, mas o resultado é tão agradável e satisfatório, que tais erros passam em branco. Jackson é o cara, e creio que vai ser por muito e muito tempo, seja comandando épicos gigantescos sem precedentes, seja dirigindo dramas emocionantes e mais simples. Devo ser o único no mundo a dizer isso: Um Olhar do Paraíso é um dos melhores filmes deste ano que acaba de começar.


Nota: 9,0

Matheus Pereira

2 comentários:

Em 1° lugar parabéns pela crítica!
Fico feliz em saber que você também gostou do filme.Fiquei indignado ao saber que os críticos internacionais não aprovaram o longa :/
Enfim,suas críticas estão cada vez melhores =]

19 de fevereiro de 2010 às 19:28  

Hugo! Quanto tempo cara! Visitei seu blog e adorei as mudanças! Também fiquei extremamente indinado com toda essa "raiva" dos críticos com o filme. Eu achei o máximo!

Muito obrigado e volte mais vezes!

Abraço!

19 de fevereiro de 2010 às 20:27  

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