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Crítica - A Estrada

A Estrada é, definitivamente, um road-movie. Road-movie, como o próprio nome já supõe, é um "filme-estrada", ou seja, se passa na estrada, no caminho. Nunca para. Quando para é de visita, mas não fica em apenas um lugar. Um exemplo de road-movie é o excelente Diários de Motocicleta do brasileiro Walter Salles e o mais recente Zumbilândia. Seu (s) personagem (ens) está sempre na estrada, sempre tem um destino, ou ao menos, um caminho a trilhar. No caminho passam por várias dificuldades e conhecem um bocado de pessoas. Um exemplo clássico de road-movie é, por que não, O Mágico de Oz, tendo em vista que a menina vai caminhando até seu destino e no caminho conhece vários seres e aprende várias coisas. O clássico escrito por Mark Twain talvez tenha influenciado muita gente com sua narrativa ligeira e os acontecimentos sempre excitantes. Essa é a qualidade de um road-movie: está sempre "caminhando", "evoluindo". Nunca fica muito tempo em um lugar só. Está sempre se movimentando. Digamos que é um verdadeiro nômade. As pessoas gostam disso. Gostam de personagens que tem um objetivo a ser alcançado, gostam que os personagens a cada momento estejam em lugares diferentes, assim, a trama não fica monótona e nem repetitiva, afinal, de tempos em tempos está em um lugar diferente e sofrendo coisas diferentes. Eu, particularmente, adoro road-movies. Mas este estilo não está isento de problemas. O grande problema desse tipo de filme, talvez seja o fato de que, muitas das vezes, a história se torna episódica. Cada lugar é um episódio, cada parada é um novo capítulo, cada pessoa que cruza o caminho é uma história, e isso ás vezes confunde, desvia a atenção do espectador e atrapalha narrativamente, afinal, trata-se de um filme, não de uma série ou novela. Um road-movie, funciona realmente e se torna uma experiência agradável e divertida nas mãos certas e conscientes. David Lynch, Ridley Scott, Alfonso Cuarón, o já citado Walter Salles, já se aventuraram nesse estilo de filme, e foram bem sucedidos. Um road-movie não pode ser apenas uma viagem visual, em que a cada momento um novo lugar é conhecido. Há de ser um "road-movie mental e emocional". Sim. Junto com os lugares, o (s) personagem (ens) deve (m) crescer mental e emocionalmente. No caminho deve aprender, olhar, dizer, escutar. Um personagem de road-movie tem de começar de um jeito e terminar de outro completamente diferente. Pensando diferente, tendo pontos de vista diferentes. A Estrada é um road-movie completo. Visual e mental, o filme de John Hillcoat é um legítimo e excelente "filme estrada", em que a estrada percorrida pela mente é mais importante daquela percorrida fisicamente. Mas um "filme estrada" só chega ao ápice quando o espectador aprende algo ao lado do (s) personagem (ens), "A Estrada" consegue tal feito em partes, mas falha em outras.

Baseado em um livro de Cormac McCarthy (a mesma mente criativa que concebeu Onde os Velhos Não Têm Vez) a história é sobre um homem (que não tem nome, se chama Homem) e seu filho (que também não tem nome, se chama Rapaz), vivendo em um mundo pós-apocalíptico, bem no estilo "Mad Max", os dois sobrevivem no limite, em situações extremamente precárias. No caminho, os dois aprendem com muitas coisas e pessoas, mas principalmente, um com o outro. Os dois estão indo para o sul, fugindo do rigoroso inverno. Durante essa perigosa odisseia, o Homem vai lembrando dos últimos dias do "mundo normal" ao lado de sua mulher.

Note a enorme diferença entre o "mundo normal" e o mundo pós-apocalíptico. Logo no início vemos flores coloridas, um cavalo, roupas e acessórios coloridos e muita cor. Logo depois somos jogados alguns anos no futuro e somos apresentados a um mundo caótico, sombrio, sem cor, sem vida. Um mundo que fora devastado por alguma catástrofe cuja qual não conhecemos, ficamos suspensos, não sabemos ao certo o que de fato aconteceu. Aos poucos, com ajuda de flashbacks, vamos entendendo um pouquinho sobre o que ocorreu. A fotografia é excelente. E já se destaca nas primeiras cenas recém citadas. A diferença entre um mundo é outro é notável, e o universo devastado é um dos melhores e mais reais do cinema nos últimos anos. Há de se dizer que o mundo devastado é bem econômico. Sem muitos exageros e pouquíssimos efeitos especiais, o diretor de fotografia faz com que o pouco vire muito, com muita criatividade. É sem dúvida alguma um grande injustiçado ao Oscar nesta categoria.

A direção de John Hillcoat é correta. Não extraordinária, tenho que confessar. Não trás nada novo na área e para o gênero (road movie e pós-apocalíptico), mas é correto e nunca deixa de ser interessante. Mesmo não inovando, permanece na linha "correta", segue o manual, com quadros interessantes e planos convencionais. Hillcoat acerta ao dar prioridade à história não à ação, embora esta tenha espaço considerável com cenas bem orquestradas. Hillcoat sabe usar cada aspecto da produção na frente de sua câmera, sabe usar a técnica, a história e as atuações, ou seja, dá espaço para tudo.

O roteiro é competente. Bem adaptado por Joe Penhall, o roteiro, na maioria das vezes, é correto, mas tropeça de vez em quando. Vamos analisar. Primeiro algumas partes boas: o roteiro acerta ao deixar os clichês do gênero de lado e dar bastante ênfase à relação de pai e filho, à sua viagem, aos encontros com outros personagens. O roteiro acerta ao não dar muitas informações e mostrar apenas o necessário. Mas nem tudo são flores no roteiro de "A Estrada". Os flashbacks ora funcionam, ora não. Na maioria das vezes os flashbacks ajudam, mas ás vezes estes se tornam desnecessários. Muitos pontos interessantes são apenas citados ou nem são tocados. Um ponto muito interessante é sobre o "início do fim", mas este é mostrado apenas em flashbacks dentro da casa. Não vemos como tudo começou, como o mundo foi acabando. Não falo sobre os motivos que fizeram com que a população fosse dizimada, mas seria interessante se o roteiro mostrasse um pouco de como o mundo foi ruindo. Outro ponto interessante que não tem o devido cuidado, é o que diz respeito aos canibais. Pouquíssimo é mostrado sobre tais pessoas. Não há embates (morais ou físicos), e personagens que poderiam ser bem explorados ficam descartados e pouco sabemos sobre tais canibais. Outro pequeno erro do roteiro é a velocidade de certas coisas. É um road-movie bem rápido. Pode ser um ponto a favor ou contra, já que impede que o filme caia na monotonia, porém certas coisas vão e vem num piscar de olhos, não há muito tempo para apreciar algum personagem ou alguma passagem. E no final, tudo se resolve mais rápido do que o esperado e os créditos surgem antes do necessário. Pode sim ser um ponto a favor, mas ás vezes atrapalha.

Viggo Mortensen concebe uma interpretação magistral, única e sublime. Sem exageros, e aos poucos, o ator vai tecendo um personagem tridimensional e interessantíssimo. Um pai corajoso, forte, que mata e morre para salvar seu filho, que não tem medo de errar perto de seu filho e desvia a atenção do menino para longe da desgraça. Mortensen fora esquecido nas premiações. Pena. Mas o grande destaque vai para o pequeno Kodi Smith-McPhee, que insere uma emoção surpreendente ao seu personagem e uma fragilidade/coragem incrível. Conta com participações marcantes de Charlize Theron, Robert Duvall (confesso que não o conheci de primeira) e Guy Pearce.

Enfim, A Estrada é um ótimo filme. Visual e narrativamente, A Estrada marca e não é um filme para fracos. Seco, cru, forte e realista "A Estrada" mostra sem pudores o fundo do poço. O futuro da humanidade, em que existem os "tipos bons" e os "tipos maus", e que ambos são do tipo "mendigo". A luta pela sobrevivência, os resquícios de alma nos homens e uma faísca de esperança nas poucas crianças, fazem de "A Estrada" mais do que um simples filme sobre o fim dos dias e um perfeito retrato de quem somos nós, sobre nossos limites, sobre até onde vamos por nós mesmos e por nossos familiares. Enfim, é sobre um futuro certeiro e próximo.

Nota: 8,0

Matheus Pereira

3 comentários:

Bom texto Matheus. Sem dúvidas alguma mais um grande filme estrelado por Mortensen em mais um grande momento. Um ator que vai construindo uma filmografia das mais interessantes. Minha critica do filme sai esse fds.
ABS

11 de fevereiro de 2010 às 22:19  

Muito obrigado cara. Mortensen está muito bem mesmo. Não tenho visitado seu blog por falta de tempo (quase não tenho para o Pipoca Net), mas com certeza farei uma visita. E quanto aquela sua proposta, é só me avisar que a gente acerta!

Abraço!

11 de fevereiro de 2010 às 23:11  

Como você já viu o filme se ele nem estreiou aqui no Brasil?

12 de fevereiro de 2010 às 18:17  

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