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Crítica - Onde Vivem os Monstros

Quando você for assistir um filme, não apenas o assista, mas sim, sinta. Não apenas veja, tente enxergar nas entrelinhas cada mensagem que o filme lhe deixa. Não apenas pare e assista um filme sem pretensões, pois até o pior dos filmes tem lá alguma qualidade. Dedique toda a sua atenção para o filme, faça com que não apenas os olhos fiquem voltados para a tela, mas o cérebro e a alma também. Não adianta nada um filme ter coração e alma se a pessoa que o assiste não tem. Onde Vivem os Monstros, novo longa de Spike Jonze (a mente estranha por trás de Quero Ser John Malkovich e Adaptação) necessita disso, de espectadores com alma para se fazer completo.

A história superficialmente é simples: Max é um menino travesso, que é posto de castigo, preso em seu quarto. Usando a fértil imaginação, Max cria um mundo novo, habitado por monstros e que ele é o rei. Jonze baseou-se numa história simples para contar o valor da amizade e dos velhos costumes. Da perda das amizades e da inocência (que consequentemente leva a imaginação infantil junto). Jonze se aprofunda nestes temas com maestria e segurança, nunca temos a impressão de que o diretor se perde em suas análises ou em suas metáforas (que não são poucas, e serão analisadas mais tarde). Max é um menino que vê sua mãe desmoronando e sua irmã, até então sua melhor amiga, crescendo e deixando de ser aquela que brincava com ele. ali, ele vê que as coisas mudam e nem sempre são como ele quer. A tristeza do garoto ao ver que a irmã não dá mais atenção a ele e que ela nada faz quando o vê chorar emocionam e remetem a tudo o que nós já vivemos ao menos uma vez na vida. A mãe de Max está mergulhada em uma clara depressão, triste com o trabalho e sozinha (viúva, muito provavelmente) a mulher chora e tenta fazer de tudo para que seus filhos não notem tal tristeza.

Antes de conhecermos os monstros, Jonze nos apresenta um prólogo, onde conhecemos Max e seu espírito arteiro (e um tanto mimado, talvez devido a falta do pai), um pobre cachorro que é perseguido por Max, a irmã de Max, que cresce e não que mais saber da pobre criança e a mãe de Max, depressiva e perdida. No curto prólogo, Jonze consegue uma das coisas mais difíceis: ele faz com que nos identifiquemos com as pessoas da tela, isso em um curto espaço de tempo. A história da criança com uma família desestruturada e que tem como fuga a imaginação ou um mundo fantástico pode até ser clichê, mas a forma como Jonze a conta é que faz a diferença.

Sobre as metáforas, bem, elas estão lá. E não são poucas. Mas vou citar as mais claras: Max em certo momento conta para sua mãe a história de um vampiro que perde os dentes e nunca mais poderia ser um vampiro(metáfora que se repete mais tarde), bom se você prestar bem atenção verá que os "dentes perdidos" simbolizam a inocência, os costumes e a infância. Perdidos estes atributos, nunca mais eles serão achados. Quando você perde a inocência, nunca mais você terá ela de volta, tal qual a infância e os costumes. Quando você os perde você nunca mais terá de volta. A outra tem a ver com os monstros. Troque cada monstro por pessoas normais, inverta os papéis e você terá um grupo de pessoas perdidas. Os monstros são o nosso interior, os monstros são o que há dentro de cada um de nós, escondido lá dentro ou aflorado para todos verem. Pessoas que perderam os costumes e estão vendo as amizades e a união irem embora. E é quando Max chega que os monstros enxergam a última esperança, é em Max que os monstros veem a oportunidade de ter os velhos costumes (brincar, correr, derrubar árvores, dormirem juntos em uma pilha, um em cima do outro) que eles tinham, mas que perderam com o passar do tempo. Quando Max chega e se denomina rei os monstros voltam a se divertir, a ter felicidade, a derrubar árvores e dormirem juntos. Para alguns parece uma bobagem, mas para eles são coisas simples que significam muito. Dormirem empilhados era um costume antigo, um dos preferidos dos monstros, mas que foi sumindo quando alguns monstros foram embora, quando alguns problemas surgiram e quando os "dentes" caíram.

Jonze analisa profundamente a alma de cada personagem, suas manias, seus sonhos (Carol, sonha apenas em voltar a ser como era antes, todos juntos, dormindo empilhados e derrubando árvores por aí), seus medos, aos poucos (Jonze leva tudo com calma, nada é mostrado de repente ou sem propósito, muito está subjetivo e tudo tem uma razão de ser) vamos conhecendo e nos comparando com cada monstro. Podemos até mesmo escolher com qual nos parecemos mais. Jonze usa os efeitos especiais e a bela fotografia a seu favor, Jonze nunca deixa que a parte técnica do filme (que é impecável) seja mais importante que a parte narrativa e emocional da história. Os personagens vem em primeiro lugar, fato raro ultimamente.

A parte técnica do filme, como acabei de comentar, é perfeita. Começando pela fotografia, bela e perfeita. A floresta, as paisagens, as cores. Algumas cenas parecem pinturas. Digna de aplausos e merecedora de ao menos uma indicação ao Oscar. A trilha sonora é um das mais agradáveis de se ouvir dos últimos meses. Misturando músicas cantadas por crianças, instrumentais e outros tipos, a trilha se destaca por sempre tocar nos momentos certos e nunca se tornar cansativa. Os efeitos especais imperceptíveis impressionam, você nunca sabe o que é maquiagem e o que é CG. Outra parte forte do longa é o roteiro. Adaptado de um pequeno conto de Maurice Sendak, Jonze emprega seu estilo e não esquece da alma do conto. Parece que o conto nasceu para Jonze como Jonze nasceu para o conto, tamanho cuidado concebido ao roteiro.

Enfim, Onde Vivem os Monstros é agradável, inteligente e emocionante (impossível não derramar uma lágrima ou, ao menos, fazer de tudo para que esta não saia), faz uma ponte entre espectador e personagem, em que nos identificamos e sentimos as mesmas coisas.

Afinal, não há algo mais poderoso que a imaginação de uma criança e de Spike Jonze.

Nota: 8,0

Matheus Pereira

1 comentários:

Eu preciso muito assistir esse filme. É bom saber que Jonze é louco, mas é um louco sensível. Boa crítica Matt.

14 de janeiro de 2010 às 18:06  

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